Fidel Castro completa 81 anos nesta segunda-feira. Afastado do poder há 1 ano, para cuidar da saúde, a condição atual do ditador cubano ainda é tema de especulações e mistério. O mesmo mistério que permeia mentes estrangeiras a respeito do modo de vida da população do país.
É incrível a curiosidade das pessoas por Cuba, um dos únicos redutos remanescentes do comunismo no mundo. Basta lembrar das perguntas dos amigos quando eu voltei de lá: Como é? As pessoas são pobres, mas felizes? Educação? Saúde? E o Buena Vista? E o Orishas?
Desde sempre tenho interesse pela ilha. Da história da revolução à biografia de Che Guevara e às histórias de Pedro Juan Gutiérrez, li bastante sobre o país. Mas só indo até lá e conversando com aquele povo tão caloroso é possível ter a noção (mais ou menos) real de como se vive em um país isolado do resto do planeta e entender que aquela realidade vai muito além do que Wim Wenders mostrou no cinema ou do sucesso do Orishas.
Estive em Cuba há dois anos. Fui ciceroneada por um publicitário cubano, de 40 e poucos anos, que trabalha numa agência que presta serviço - claro! - para o governo (vide texto abaixo, escrito um dia depois da volta). Em 8 dias, experimentei sentimentos absolutamente contraditórios e inéditos pra mim. O próprio sistema da ilha me fez sentir assim. A divisão começa no bolso. O peso cubano é a moeda corrente local. Mas qualquer estrangeiro em turismo por lá faz uso de outro peso: o conversível. Na teoria, 1 peso conversível vale 1 dólar. Mas na hora da troca, você deixa 20% de taxa para o governo. Cubanos recebem em peso, mas ganham gorjetas em pesos conversíveis. Assim, as propinas representam mais em valores do que muitos salários mensais.
Nos primeiros dias da viagem, eu me senti pobre-pobre de marre-marré. Meu espírito de turista se lembrava do quanto eu tive que trabalhar para ir até lá. O quanto me faltava de dinheiro para ir a outras províncias cubanas, além de havana, como eu gostaria de fazer. E o quanto era mais fácil para os três espanhóis que eu conheci viajar a ilha toda, já que eles ganham em euro.
Mas, inevitavelmente, me senti triste por ser tão afortunada comparada àquela gente. Ao constatar as condições absolutamente precárias de trabalho daquelas mulheres nas fábricas de charutos. Ao ser abordada na rua por pessoas que te pedem alguma coisa, “qualquer coisa”. Ao ver dezenas de pessoas morando em apenas um cômodo. Meus pensamentos ficaram ainda mais confusos ao ver que, de fato, apesar de todas as adversidades, são um povo alegre, mesmo. Um povo caloroso, musical, sensual. Me senti numa espécie de zoológico ou laboratório, observando a forma como aquelas espécies vivem. Cerceadas. Enjauladas. E como o modo de vida delas é diferente do meu.
A despeito de toda a publicidade positiva que o governo cubano não se cansa de fazer acerca do regime – e que está espalhada em outdoors por todos os cantos do país -, a realidade é bem diferente. Esta história de que em Cuba as pessoas “são pobres, porém felizes” é uma meia verdade. As opiniões se dividem dependendo da faixa etária do seu interlocutor. Os mais velhos, aqueles que viviam na ilha antes da Revolução, preferem o sistema atual, porque dizem que na época de Fulgêncio Batista a vida era muito pior. Hoje, ao menos, têm onde morar e o que comer. Os mais jovens, que nasceram sob o comando de Fidel, não toleram o comunismo e não vêem a hora de poder sair de Cuba, muito embora não bradem suas opiniões, porque, como se sabe, se forem ouvidos, são duramente repreendidos.
Este choque me atormentou durante todos os 8 dias. Eu comparava aquilo com a vida no meu país, que também é difícil. Não sei se é um raciocínio muito classe-média, mas eu penso que aqui ninguém frustra seu sonho deliberadamente. Se houver empenho (ainda que a duras penas, durante a vida inteira), talvez se consiga realizá-lo. Em Cuba, não. À exceção de atletas e artistas, é proibido sair de lá. E lá não se pode mudar de casa. Não se pode ter um carro, sem autorização do governo. Te obrigam a viver de um modo que talvez você não queira. Te obrigam a viver de uma forma que um dia alguém julgou que seria a melhor, a ideal. E não há possibilidade de mudar. Os jovens cubanos têm que tolerar milhares de gringos endinheirados desfilando câmeras fotográficas de última geração, roupas, tênis e outros produtos capitalistas que eles não podem ter. Porque alguém proibiu que eles tenham. Vão engolindo seus desejos, seus sonhos, sua prosperidade, enquanto bebem rum e batucam músicas na mureta do Malecón em noites quentes. Assim aguardam a morte de Fidel.
Feliz Cumpleaños, el comandante!
12.8.07
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