Eu lia tudo o que ela escrevia e me identificava aqui e ali. Ela tinha sentimentos absolutamente estranhos e conseguia traduzi-los do jeito que eu gostaria de fazer, não fosse a minha incompetência literária. De um jeito às vezes doce, às vezes um tiquinho agressivo (Thom Yorke protagoniza um misto de gritos e gemidos neste momento – apropriadíssimo, diga-se).
Quando a conheci, achei que fosse mais magra. É bonita, mas tem um comportamento social um tanto estranho. Por exemplo, no meio da conversa ela puxou um papel, os fones, e começou a escrever uma música.
Assim que se livrou dos fones, me falou sobre a cria e os projetos. Falamos sobre música e, superficialmente, sobre amores. Mas aquele comportamento me incomodava. Não ele todo. Talvez o ar blasé, de quem não se importa com o que está acontecendo naquele momento. Talvez o fato de ter um modo de vida fora do comum. Alguém que, pelo que diz, parece fazer questão de mostrar que é diferente da maioria. Que tem outros pensamentos, que não aqueles que nos querem fazer acreditar que devemos ter. Talvez um pouco rebelde, ainda que tenha passado da idade (afinal, existe tempo para a rebeldia?).
Imediatamente me lembrei de um dito ao meu respeito, que ouvia há até pouco tempo: você faz questão de estar sempre do lado oposto da força.
Era isso. Ela está do lado diametralmente oposto da força. E não esconde o lado que escolheu, ao contrário. Esse comportamento me intimidou. Não me deixou à vontade. Diria até que me assustou um pouco.
E tinha algo ali com o que eu me identificava. Tinha alguma coisa nela que também era minha, além dos cabelos avermelhados. Estamos do mesmo lado e esta escolha talvez seja incompatível com alguns desejos.
E assim, a despeito do que queremos, seguimos assustando muita gente por aí.
*
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Eu e duas amigas chegamos ao bistrô às 11 e meia da noite de uma sexta-feira-véspera-de-feriado-de-natal. Adivinha? Claro que estava lotado.
“Vocês podem esperar lá em cima. Cerca de 40 minutos.”
Ok. O estômago estava grudado nas costelas depois de uma sexta-feira-véspera-de-feriado de trabalho, mas eu adoro aquele lugar que tem salinhas lindas de espera, com sofás de veludo, poltrona com estampas de zebra e quadrinhos fofos nas paredes coloridas. Subimos.
Logo avistei dois rapazes barbudos (ah, vá?) que habitavam uma delas. Comuniquei a dupla e pra lá fomos. Não demorou até que uma delas constatasse: aqui tem dois rapazes barbudinhos. Bonitinhos. E gays.
10 minutos ali foram suficientes para a mais esperta fazer mais uma nobre constatação: este lugar é uma delícia. Mas não é o “lugar certo para prospectar”.
Entendi tudo: eu tenho freqüentado os lugares errados há mais de 5 anos!!!
22.12.07
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