10.1.15

Sobre Desencontros e Impossibilidades


Tenho pensado em você. Fico imaginando o que está fazendo. Se transformou aquele ar depressivo e desanimado em algo que te alimente. Ou se fez como de costume e deixou pra lá, achando que não é nada demais, pegou a bici e saiu pedalando por aí. Como se o vento na cara e aquela sensação de liberdade fossem mágica e definitivamente resolver seu desânimo.

Eu tenho tentado fugir do clichê “saudade do que poderia ter sido”. Envelhecer tem lá suas vantagens. Nos traz um ceticismo besta, às vezes. Mas, sim, eu penso nisso. Embora a distância nos dê uma leitura diferente dos acontecimentos, uma definição diferente das pessoas. De longe, você me parece ótimo. Imaturo, mas ótimo. A lembrança... essa traiçoeira que apaga tudo o que nos convém. Um instante e... Não, você não é ótimo. Você não foi ótimo. Envelhecer também nos faz reter na memória a parte ruim.

Você não está ótimo. Eu sei que não está. Você continua projetando no outro as suas questões. Você continua insistindo em não se encontrar com elas. Em não enfrentá-las. Você continua fugindo do mais importante, de bicicleta. Cabelos ao vento. Sentir-se livre não é SER livre, meu bem. Talvez você nunca seja.

E cá estou eu falando sobre você. Você não fala sobre você. Só eu. Do seu jeito de olhar o mundo. Do seu senso de justiça. Do seu jeito de brigar pelo que acha certo. Do seu jeito de pegar na minha cintura. Do seu jeito de me olhar de lado com a sobrancelha arqueada. Do seu jeito de prender o cabelo. Do cheiro do seu cabelo. Do seu jeito de me dar um beijo.
Só eu falo sobre você. Você, não. Você não fala do seu medo. Da sua dor. Da sua incapacidade de se conectar. Do vínculo estranho de que você não quer se desfazer. Dos laços novos que você resiste em estabelecer.

Eu sempre acho que vou me deparar por acaso com você na rua. Ah, o acaso... Me sinto uma personagem de “Medianeras”. Sempre tenho a impressão de que você desce por uma calçada da Augusta no mesmo momento em que eu subo pelo outro lado da rua. Imagino que você desce a rua de bicicleta enquanto eu devoro um hambúrguer na lanchonete olhando o movimento. Eu sei que você também pensa no não-encontro. Eu sei que você também acha estranho. “Medianeras”. Você já viu? É sobre as impossibilidades dos encontros, dos laços, do amor.

Na minha cabeça, construo a cena. Encontro casual. Na rua. Vai ser uma alegria. Não! Vai ser constrangedor. Eu vou tentar soar natural, sorrir e puxar uma conversa. Você vai continuar sério, responder com monossílabos, não vai saber o que dizer. Você nunca sabe o que dizer.

E vai acabar assim, exatamente como foi. Constrangedor. Eu, fazendo perguntas. Você, sem saber o que dizer.