30.3.09

Dia de Merda

ou Quando o universo conspira contra você, não adianta se esforçar: vai dar tudo errado

Eu tinha um filme importante pra ver pela manhã, mas não pude comparecer porque havia reunião na firma. Acordei as 8 e meia da madrugada, tentei fazer cara de gente que já estava desperta desde as 5h30 e fui seja o que deus quiser. Para não chegar atrasada à reunião, estacionei o carro na primeira vaga que encontrei, mais ou menos a uns 2 km da firma, e fui andando. As vagas são disputadas a tapas por ali. E eu não tinha tempo para conflitos físicos.

Ao chegar, percebo que não existe a menor pré-disposição dos envolvidos na reunião de mexer o dedo mindinho, quanto mais de levantar as bundas da cadeira e se dirigir à sala. Consulto a direção:

- Vai ter a reunião das 10 horas, né?
- 10 horas? A reunião é ao meio dia.


Que ótimo! É a resposta que todo ser humano que odeia acordar cedo passa a vida inteira querendo ouvir. Que você poderia ter dormido duas horas a mais. Tratei, então, de arrumar coisas que me ocupassem por aquelas duas horas inúteis no ambiente de trabalho, tais como:

- pagar impostos pela internet;
- marcar consulta com um pneumologista para tentar, quem sabe, parar de fumar;
- conhecer áreas pouco exploradas no conglomerado de comunicação aonde eu trabalho há 3 anos;
- filar bóia no evento realizado no saguão;
- conhecer celebridades da televisão;
- outras tarefas tão interessantes quanto estas.


Faltavam 10 minutos para o meio dia quando ouço meu santo nome ser solicitado na sala da direção da firma:

- Olha, os planos mudaram um pouco, de modo que zzzzzzzzzzzz...
Zzzzzzzzzzz...
Zzzzzzzzzzz...
...vamos cancelar a reunião que estava marcada para hoje, então.
- puta que pariu-eu tenho sono-odeio todos vocês-acham que eu não tenho mais nada pra fazer na vida? Ok, vou almoçar.


Que ótimo! É a resposta que todo ser humano que odeia acordar cedo E tinha um filme importante para assistir naquela manhã passa a vida inteira querendo ouvir. Que você poderia ter dormido 2 horas a mais e ter ido ao cinema.

O jeito foi encarar o refeitório da firma, que, justiça seja feita, não é dos piores. Dependendo do dia, é até bom. Para almoçar no refeitório, o santo funcionário precisa apresentar sua funcional. Objeto que, por uma razão ainda misteriosa, desapareceu da minha bolsa. Eu tinha dormido pouco, perdido um filme, uma reunião e não podia nem alimentar meus restos mortais. Um santo colega me salvou e pagou o almoço, prova de que, obrigada deus, ainda existem pessoas com bom coração que trabalham bem ao meu lado neste planeta.

Num dia como este, eu já esperava um cardápio de sardinha refogada com jiló e pimentões ao molho de maracujá - tudo o que eu odeio junto. Mas não. Consegui ingerir alguma quantidade de penne ao sugo e me mandei para o batente. Às 4 da tarde eu já estava estafada. Porque pra quem chegou às 10 da manhã já é quase o fim do expediente. E o meu só terminava dali a 6 horas.

Por telefone, uma amiga carioca que estava em São Paulo me dizia que queria sair. Também por telefone, o namorado agilizava os convidados, marcava o lugar e me recomendava: sai daí correndo às 22h e se manda pra lá. Não havia nada que eu desejasse mais naquele momento.

Me lembrei do carro estacionado a uma distância monumental da firma. Teria de andar sozinha, à noite, por ruas escuras e mal assombradas até chegar a ele. Resolvi buscá-lo enquanto o sol ainda brilhava e me arriscar num duelo corporal por uma vaga nas cercanias. Depois de dar 4 voltas no quarteirão com alguma dificuldade de locomoção do popular 1.0, encontrei a vaga dos sonhos. E pensei: nada na vida pode ser assim tão ruim. O dia tá uma merda, mas alguma coisa tinha de dar certo. Convenhamos, eu merecia uma vaga VIP.

Mas é claro que podia. Como o carro tava mais pesado do que o normal, fui, assim como quem não quer encontrar nada, checar os pneus. E aí... Ai, meu santo crispim dos dias fodidos... Fui completamente invadida por uma indescritível vontade de:

a) sentar na calçada e chorar;
b) pegar o primeiro táxi que passasse, ir pra casa e não sair de lá nunca mais;
c) possuir uma granada capaz de fazer o mundo acabar em uma tirada de pino;
d) saber trocar um pneu furado;
e) gritar todos os palavrões que eu conheço em apenas 32 segundos.


Optei pela quinta alternativa, respirei e voltei para a firma. Nas 3 horas seguintes, estaria impossibilitada de deixar o complexo de comunicação, amarrada à minha bola de ferro. E queria morrer. Por telefone, avisei o namorado de que possivelmente me atrasaria para o encontro. Que talvez não fosse ao encontro. E, quem sabe, matasse todas as pessoas da redação. E ele foi voando me salvar, com suas asinhas de anjo, sua chave de roda e o telefone do seguro. Às 22h em ponto saí correndo do inferno e me mandei pra lá. Ninguém morreu nesta noite. Cheguei em casa com a integridade física preservada. A moral? Marromêno.

Nunca duvide de um dia de merda.

Enfim, férias...

*

19.3.09

Em 24 horas

e-mail profissional
e-mail pessoal
msn
orkut
ação e divagação
cine ação e divagação
myspace
g1
uol
estadão
o globo
e agora esse tal de twitter
[preciso de uma tela de computador mais larga]

moço, não gostei. tem mais de vida real?
cinema
enchentes
prefeito
secretário de segurança
casas de shows
jade barbosa
roubo de fuzis

mas, assim, além do trabalho, sabe? tem amigos?
só amanhã
depois de amanhã
semana que vem

e namorado, moço?
trabalho
futebol
sono
só amanhã de manhã

tem família por aí, senhor?
sono profundo
só amanhã à noite

livros, cds, dvds?
não trabalhamos com esse tipo de diversão
estão todos ali na estante

as férias demoram a chegar?
9 dias úteis
só mês que vem

*

17.3.09

Epifania

Perdemos alguma coisa no caminho. Talvez a sutileza. Talvez a quase dúvida. Ou o gostinho de pequenas descobertas.

Um se mostra, o outro embrutece. Os pêndulos que estavam em lados opostos trocaram de lado. Continuam opostos.

A magia da descoberta, toda a pureza, o saborear do desconhecido. Falta. Haverá encontro no meio do caminho? Onde é o meio do caminho?

Ainda existe estrada? Ainda é preciso empreender esforços? E o sabor? Quase irreconhecível. Não existe mais o estado elevado da alma. Que lembrança doce!

Pensar demais sufoca o sentimento. Sentir demais confunde o pensamento.


*

9.3.09

Ronaldo é gol!

Há tempos não me emocionava de verdade vendo um jogo de futebol. O calor que fazia em Presidente Prudente ficava clara nos rios de suor que escorriam pelas têmporas dos 22 corinthianos e palmeirenses em campo. Com um olho no trabalho e outro na tevê, depois de mais uma vez me surpreender com o ótimo passe de Keirrisson na área do Timão, me irritei com a saída desastrosa de Felipe do gol. Diego Souza aproveitou e anotou o primeiro gol do clássico para o meu adversário.

A entrada de Ronaldo no segundo tempo já era dada como certa e eu e o mundo inteiro estávamos loucos pra ver como ele se sairia, depois dos vinte e poucos minutos jogados contra o Itumbiara no meio da semana. A agilidade de um paquiderme em dieta é evidente. No entanto, se ganhou quilogramas, Ronaldo mostrou que não perdeu habilidade nem precisão técnica. Driblou, correu, girou e até carimbou a trave num chute consciente, quase exato e quase certeiro, fazendo metade do estádio se arrepiar e levar as mãos à cabeça com o quase gol.

Finalmente, nos acréscimos veio o que o mundo inteiro esperava. Numa cobrança de escanteio, ele se livrou da marcação da zaga, subiu e cabeceou bem do lado direito do gol palmeirense. Desencantou. E correu como um menino. Pulou as placas de publicidade em direção à torcida que com tanto amor e esperança o recebeu. Trepou no alambrado e sacudiu, gritou, sacudiu, gritou e sacudiu como se fosse o primeiro gol da vida de um atleta juvenil. Um bando de loucos gritava em Presidente Prudente, no Tatuapé, na quadra da Gaviões, na sala da minha casa e até na redação do Morumbi. Ronaldo é gol!

Do outro lado da tela da tevê, não tive reação. Paralisada. Meus olhos marejaram de emoção. Me arrepiei de alegria, como se Ronaldo fosse meu amigo. Como se eu o conhecesse. Estava realmente feliz por ele. Ele conseguiu! O gordo fez um gol! O gordo é foda! Pode dizer o que quiser: gordo, fora de forma, baladeiro. Ele é foda! Nunca vai deixar de chutar bem, de driblar bem. Não há quilos a mais e noites mal dormidas que o façam perder a experiência que adquiriu e o cacoete de matador. Ainda que seja com a cabeça, o que nunca foi seu forte.

Me impressionou a emoção de um sujeito que tem tudo na vida, já conquistou tudo o que podia e queria na carreira, já caiu, já voltou, já caiu de novo e voltou de novo... E vibra, verdadeiramente eufórico, como se fosse o primeiro gol da carreira. E eu não tenho dúvidas de que é por isso que ele sempre volta, de que é por isso que se trata de um Fenômeno.

Não deve existir um ser humano provido de coração neste planeta que não tenha sorrido e se alegrado com a demonstração do novo retorno de highlander Ronaldo, o Fenômeno, a cara do brasileiro.



Quem duvida?

*